A REVELAÇÃO
DAS QUINZE PÉROLAS DO CATARISMO [4/5]
Espiritualidade
e Práxis
“Então nós subimos para o sétimo céu, e eu vi um homem velho [...] luz e
cuja vestimenta era branca. O trono dele, que está no sétimo céu, era sete
vezes mais brilhante do que o sol. O homem velho falou, dizendo para mim,
"Aonde você vai, Paulo? Abençoado é aquele que foi separado do útero de
sua mãe." Mas eu olhei para o Espírito, e ele estava acenando com a
cabeça, me dizendo, "Fale com ele!". E eu respondi, dizendo para o
homem velho, "Eu estou indo para o lugar de onde eu vim." E o homem
velho me respondeu, "De onde você veio?" Mas eu respondi, dizendo,
"Eu estou descendo ao mundo dos mortos para aprisionar a escravidão que
aprisionou na escravidão da Babilônia." O homem velho respondeu me
dizendo, "Como você será capaz de escapar de mim? Olhe e veja os poderes
supremos e autoridades." O Espírito falou, dizendo, "Dê-lhe o sinal
que você tem, e ele abrirá para você." E então eu lhe dei o sinal. Ele
voltou sua face para baixo, para a criação dele e aqueles que são as
autoridades pertencentes a ele.
E então o sétimo céu abriu e nós subimos para o Ogdoad. E eu vi os doze
apóstolos. Eles me saudaram, e nós subimos ao nono céu. Eu saudei todos aqueles
que estavam no nono céu, e nós subimos para o décimo céu. E eu saudei meus
espíritos companheiros.”
(O Apocalipse de Paulo)
O modelo de Santidade do Catarismo é
bastante agressivo, próximo a uma estética heroica ou cavalheiresca, e com
frequência os homens santos são os que confrontam e interditam demônios, são os
que invadem os céus caóticos e, com uma voz de autoridade que geralmente advém
da posse de um sinal ou signo, forçam os demônios a ceder. O que poderia ser
tal sinal ou signo?
Falamos anteriormente do “Signo da
Origem”, a marca indelével do Espírito Eterno, que devemos reincorporar à
consciência para revertermos a maldição do esquecimento imposta por Yaldabaoth:
tal signo é a prova da nossa origem divina, e portá-lo conscientemente é algo
por si só escandaloso e aterrorizante para os Arcontes. Entretanto, embora
todos os homens espirituais possuam tal signo, em geral não o portam, porque
não se lembram quem são, nem como foram aprisionados neste mundo.
A re-incorporação do Signo da Origem:
eis a Sagrada Teogamia, quando o homem novamente encontra sua Epinoia – a memória
espiritual consciente enviada pela Minne – e se torna Theoantropos, homem
divino e perfeito, ou ‘Perfecti’, na terminologia cátara medieval. Este
processo, longo, duro e extremamente instável e incerto, cheio de armadilhas e
dificuldades, somente se desenvolve através de uma práxis constante e cíclica
de isolamento interior, catarse e Theosis. Neste estágio, três dos Mysteria
cátaros ou “Pérolas” se referem à práxis ou prática diária e perene do Cátaro
dedicado; estes Mysteria estão custodiados pelo Éon Daveithai, um Siddha (guia)
cujo olhar incessante busca pelo mundo, sem parar, os homens prontos a serem iniciados e
admitidos no Pleroma. Civilizações antigas o entenderam erroneamente como um “deus”
e o chamaram Vides, Hades, Plutão ou Pwyll Penn Annwn, o guardião do “mundo dos
mortos” onde se obtinha o descanso e restauração supremos; ou então como
Mercúrio ou Heimdall, o Guardião da Ponte que une o humano ao divino. Seus
anjos são Micheus, Michar, Mnesinous, os que batizam na fonte da Água da Vida
Eterna.
Bonomia, a Bondade Divina
A Santidade está conectada com o potencial da bondade infinita
A Santidade não se traduz em atos
ascéticos ou leitura de livros, mas no potencial crescente da bondade, da
atitude nobre da compaixão desprendida do alto da Divindade pessoal. A medida
do Potencial Divino é a bondade, que não é ser passivo nem evitar a Guerra, mas
simplesmente ter a compaixão de auxiliar o bem daquilo que existe, e devolver o
inexistente à inexistência, eliminando sua dor e deformidade.
Isto é difícil de se distinguir. A
chave está na razão da guerra que travamos: em todas as atitudes tomadas por um
Cátaro, existe um denominador comum que é minimizar o sofrimento. Às vezes, é
necessário exercermos compaixão para diminuir o sofrimento numa determinada
situação, mas às vezes é necessário atacarmos, combatermos e sermos duros para
evitar que alguém gere ou propague sofrimento. Às vezes, é preciso cortar o mal
pela raiz: em situações extremas e radicais, eutanásia ou suicídio. Tudo isso é
bonomia, é Bondade divina, pois é se colocar como contraponto ativo da
principal atitude expressa pelo “amor” doentio de Jehova-Satanas: a extração da
Dor, seu alimento predileto.
Para o Cátaro, um nascimento neste
mundo é uma tragédia, e o recém-nascido é acolhido e amparado com amor e
dedicação, mas tristeza profunda por ele ter caído no abismo Terra. As
religiões de Jehova-Satanas pregam a abstinência e o sexo reprodutivo para
gerar mais pasto de onde ele possa extrair dor. Para nós, ao inverso, deve-se
sim esfriar as paixões – mas qualquer forma de sexo não-reprodutivo é preferível
à gravidez. Os filhos que um Cátaro já tenha: é um dever criá-lo para ser um
homem íntegro e honrado, puro; os que ainda não tiver, ele evitará ao máximo
ter.
Tal postura em relação ao sexo foi um
escândalo na era medieval: afinal, se atacava a doutrina católica de estar “aberto
à vida” e se dizia francamente que os casais deveriam fazer qualquer coisa,
menos engravidar... nos autos inquisitórios, acusações absurdas de orgias e
excessos contra os Cátaros, chegando ao ridículo de se incluir como “prova”
para a condenação de um grupo de homens que eles cavalgavam em carangueijos
gigantes até locais de orgia com demônios... os inquisidores incluíram de tudo
nessas acusações de “orgias”, de sodomia até canibalismo. O que é uma ironia
amarga, afinal a última coisa que se poderia acusar uma religião malteísta, que
prega o desligamento voluntário das experiências mundanas, é de hedonismo.
Mais ainda: Vivemos numa cultura
doentia que quer propagar e prorrogar a “vida” não importa em que estado, às
vezes forçando seres a viver no mais absoluto sofrimento: pessoas em coma
irreversível, animais sem patas, deformidades horríveis e dolorosas. Chamam
isso de bondade, de respeito à vida, mas é uma maldade diabólica, como a dos
espíritas que pregam a NECESSIDADE do sofrimento para evolução.
Não precisávamos sofrer: éramos
perfeitos e eternos antes de cairmos vítimas dos Arcontes! Por isso a “vida” do
Cátaro não é vivida com o objetivo de aproveitar os prazeres ou “ser feliz”,
mas sim nos devotamos à tarefa da libertação própria e do alívio, sempre que
possível, do sofrimento alheio. Isso é Bonomia.
A Pureza da Origem está na composição do Theoantropos
O pecado original vem do demiurgo, e
a pureza original do Theoantropos. Nascido do pensamento luminoso do Pai, ele é
original e incondicionalmente puro. Quando o homem se liberta dos medos,
quimeras e pensamentos, ele brilha com a pureza original do Pai.
Para isto é necessário mudar nossa
composição interna, tendo passado pela metanoia e feito votos de catarse até o
ultimo minuto de vida.
Paratge
Paratge é uma palavra em Occitano
(dialeto provençal falado pelos cátaros medievais do sudoeste francês) que não
tem equivalente em nenhum outro idioma, vivo ou morto. Nos textos cátaros era
sempre empregada num sentido semelhante ao Dharma hindu, uma lei ou ordem
natural, o caminho do correto – mas não é este o significado.
As novelas de cavalaria, o ideal
cortesão dos Trovadores, a bonomia e o código de honra dos fidalgos são
aplicações terrenas da Paratge, e tocam superficialmente seu significado.
A Paratge, em palavras simples, é a
conduta natural do Espírito, aquilo a que ele se sente impelido. Estando
totalmente fora da moral deste mundo, acima do bem e do mal, a Paratge se
manifesta através da Pureza do Espírito, quando ele responde aos desafios do
inferno com sua Honra, de uma maneira que não provém da mente e pode ser
interpretada como loucura, extremismo ou ingenuidade por aqueles que só
conseguem enxergar o mundano.
No processo de Catarse a Paratge é
redescoberta naturalmente, e vai gradualmente destruindo noções satânicas como
a malícia, o egoísmo e o medo. A própria vida vai sendo percebida como uma
estadia temporária, e relembra-se a Hostilidade ao Demiurgo. Aquele que
despertou totalmente para a Paratge é um Cavaleiro do Espírito como Parsifal, e
seu destino é encontrar o Gral.
A partir deste ponto, a Honra tomará
um significado totalmente novo: não apenas um código de regras morais, não a
expressão de uma ‘Regula Monachorum’, não uma mera moral: a Honra, para o
Cátaro, o Cavaleiro do Gral empreendido na busca pela Minne, será a abnegação
absoluta, o dar tudo de si na guerra contra Jehova-Satanás. E ainda assim, não se corromper na luta, mas ser o contraponto da malícia, um exemplo luminoso de cortesia e bondade natural como não há entre os filhos do horror! Da Paratge que os trovadores medievais cantavam, nasceu a cultura da cavalaria, do que é a noblesse, mas a fonte deste comportamento não é senão a Pureza absoluta do Espírito que nasceu do pensamento do Pai de Puro Amor.
A Paratge é algo diferente para cada
um, mas mutuamente reconhecível pelas pessoas espirituais, e embora possa ser
expressa e falada, sua explicação completa em palavras mundanas é virtualmente
impossível para quem não a vivenciou.
Catharsis
Catharsis (purificação) é um antigo termo místico. Sua
origem como prática iniciática se perde nas remotas escolas da Atlântida. A
Catharsis é completa purificação, preferência incondicional e enérgica pela
pureza divina, e o caminho para a perfeição na pureza – o Catarismo é
literalmente a prática da Catharsis.
A Catharsis assume esforços heróicos
Por sua natureza sofrida e abusada, fragilizada pela remodelagem adaptativa, o
homem é preso na rede do demônio. Ele é doente, fadado ao fracasso. Ele está
num estado de calamidade.
A Catarse completa, a perfeita pureza, é necessária para a
divinização. A Catarse assume esforços heróicos para passar por cima da
modelagem fatal, para poder confrontar uma a uma as forças demoníacas, de
dentro e de fora de si, com a força advinda do Pai.
Pois nos é assegurado pelo Pai que, enquanto desejarmos
lutar com todo o ardor do Espírito, nunca nos faltarão forças para suportar os
ataques do demônio. O Nosso Pai Incognoscível nos fornece, no seu mais alto
Amor, energia infinita através da sua Paraclese. Por isso, quando cantamos a
Evocação ao Paráclito:
- Ó SENHOR, ENVIA O
TEU ESPÍRITO / QUE RENOVE A FACE DA TERRA
Estamos na verdade chamando o Paráclito, Hipóstase de
Misericórdia do Pai, para “varrer céus e Terra” de dentro da nossa mente, para
destruir dentro de nós o mundo (o desejo-paixão que gera sofrimento e agrilhoa),
e que nossa psique renovada brilhe, livre, com a pureza luminosa do Espírito
Eterno! O Apocalipse clamado e desejado é interior, psicológico, microcósmico.
Componentes da Catarse cátara:
1. Extrema introspecção (de ‘intro’ – interna e ‘spectrum’ – luz). Adentrar a
si mesmo, olhar sem ilusões o seu eu interno.
2. Percepção do engano. Refinar os sentidos e a percepção para detectar os
enganos da modelagem adaptativa. Que pensamentos e sentimentos são genuinamente
espirituais, e quais foram “programados” para nos prender ao Mundo e sofrermos?
3. Oração, rituais e o comunicar-se com o divino são coisas espontâneas, de
momento. Evitar memorizações e formas vazias. Valorização da essência dos atos,
orações, ritos e fórmulas, ao invés da forma.
4. Desapego das paixões. Abluções constantes (limpeza interna e externa). Lavar
as mãos constantemente, antes e depois de realizar atividades mundanas sujas
como o comércio, trabalho, ou banhar-se, especialmente em rios, lagos e mares,
são atos rituais indicativos de purificação, que nos lembram o que devemos
fazer com nossas paixões e aflições.
5. Remodelagem divina. Aperfeiçoar a arte de remodelar e readaptar a si mesmo,
cortando o efeito abusivo das paixões e febres que nos acorrentam ao que
pertence a este mundo.
6. Alerta constante dentro da introspecção, estado interior de guerra. Por mais
que nós controlemos os pensamentos, não controlamos seu surgimento, daí ser
necessário um alerta constante para combatermos a modelagem adaptativa, até
nossa morte terrena. A verdadeira Paz só virá quando abandonarmos o Inferno de
Jehova e voltarmos ao Pleroma.
7. Paratge – a vida regida pelo senso transcedental, eterno e absoluto, de
Honra.
Caminho para a Suprasubstanciação de Si Mesmo
A Catharsis exclui a confissão diante do Terrível Algoz, exclui totalmente a
culpa e o remorso. Não admitimos sentimentos de culpa e pecado, pois somos
Espíritos puros, nos desfazendo de eras de maus tratos e condicionamento
satânico. Deve-se ter a consciência lúcida o suficiente para viver num mundo
que não nos pertence, estrategicamente, sem, no entanto jamais se sentir
pertencente ao mundo. O que significa que não exigimos austeridades, não
impomos jejuns nem votos de pobreza, pois o importante não é o que efetivamente
se FAZ no mundo, mas o que está no coração, o que gera paixão/sofrimento e o
que prende, ou não. Existem nove
verdades a serem lembradas diariamente, constantemente:
1. O homem é o sujeito ativo da Divinização. (O que implica esforço ativo, não uma espera passiva
de milagres ou misericórdia).
2. Só há um poder, o poder do Amor Celeste, Minne. Expresso através de Epinoia, a Memória perdida do nosso Eu
espiritual, que é a Dama distante a quem os Trovadores amavam até a morte e se
deixavam morrer de nostalgia por Ela.
3. Herança Divina. O Divino vive,
indiscutivelmente, dentro do homem, mesmo em casos de abandono extremo. SEMPRE
é possível retornar ao Pai. Muitos são fracos demais para despertarem por si,
mas esses irmãos sofridos não serão esquecidos no Final do Final.
4. ‘Strastnoe’ (o sofrimento
transformado em estado de beatitude). O Milagre das Solovki. Cada Espírito é
convidado a enxergar e reconhecer seu sofrimento mais profundo, enxergando a
vida na Terra como a própria experiência do Gólgota, e assim alçar os olhos
para o lar perdido, reatando os laços com a Minne e ganhando uma calma e um
sorriso perenes no meio da tormenta do inferno.
5. Hostilidade Essencial: não há Espírito
dono de si que não lutaria contra o príncipe deste mundo. Pessoas espirituais
lutam uma batalha mortal com ele.
6. A Última Gota. Os Espíritos
Divinos, mesmo longe da perfeição, podem condensar em si sua pura essência
sagrada, suprasubstancial, em um ato derradeiro de Honra na batalha contra o príncipe
do mundo. É possível aos que nunca chegaram a ser Perfeitos ver a Minne e
ascender ao Pleroma se o martírio na batalha espiritual foi realizado com a
máxima Honra concebível.
7 O Cálice, a Última Gota
transubstanciada de todos os mártires, irradia uma luz suave desde o Pleroma,
somente visível aos olhos do Espírito: esta luz é a essência da nostalgia pela
Amada perdida e a Pátria inalcançável.
8. A Cruz, símbolo que não
carregamos, mas que olhamos aonde ela está – pendente sobre cada ser vivo - para
relembrar qual é a essência deste Mundo: um instrumento de tortura e morte.
9.Kristos Luz, hipóstase de
Autogenes, desceu ao Mundo para vencer Morte, ensinando a Doutrina do
Despertar. Não confundir com a farsa essênia. Kristos teve várias Hipóstases
terrenas, mas para o Cátaro isso não importa (como importa às religiões locais
que floresceram através de vindas específicas do Kristos), nos importa o
Kristos Luz em sua essência atemporal, imutável e eterna.
10.A Igreja Cátara. Após vencer a
Morte com a ajuda de Epinoia, seremos reintegrados a nossos camaradas, nossos
companheiros em Espírito de todas as épocas e culturas, que fizeram o mesmo. A
congregação cátara não é deste mundo, não está no mundo, e quando a integrarmos
não seremos mais humanos.