La Montagne

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Fechados contra o Mundo e seu Rei, Espírito contra Matéria!

sábado, 20 de abril de 2013

A REVELAÇÃO DAS QUINZE PÉROLAS DO CATARISMO [4/5]


A REVELAÇÃO DAS QUINZE PÉROLAS DO CATARISMO [4/5]
Espiritualidade e Práxis



“Então nós subimos para o sétimo céu, e eu vi um homem velho [...] luz e cuja vestimenta era branca. O trono dele, que está no sétimo céu, era sete vezes mais brilhante do que o sol. O homem velho falou, dizendo para mim, "Aonde você vai, Paulo? Abençoado é aquele que foi separado do útero de sua mãe." Mas eu olhei para o Espírito, e ele estava acenando com a cabeça, me dizendo, "Fale com ele!". E eu respondi, dizendo para o homem velho, "Eu estou indo para o lugar de onde eu vim." E o homem velho me respondeu, "De onde você veio?" Mas eu respondi, dizendo, "Eu estou descendo ao mundo dos mortos para aprisionar a escravidão que aprisionou na escravidão da Babilônia." O homem velho respondeu me dizendo, "Como você será capaz de escapar de mim? Olhe e veja os poderes supremos e autoridades." O Espírito falou, dizendo, "Dê-lhe o sinal que você tem, e ele abrirá para você." E então eu lhe dei o sinal. Ele voltou sua face para baixo, para a criação dele e aqueles que são as autoridades pertencentes a ele.
E então o sétimo céu abriu e nós subimos para o Ogdoad. E eu vi os doze apóstolos. Eles me saudaram, e nós subimos ao nono céu. Eu saudei todos aqueles que estavam no nono céu, e nós subimos para o décimo céu. E eu saudei meus espíritos companheiros.”
(O Apocalipse de Paulo)



O modelo de Santidade do Catarismo é bastante agressivo, próximo a uma estética heroica ou cavalheiresca, e com frequência os homens santos são os que confrontam e interditam demônios, são os que invadem os céus caóticos e, com uma voz de autoridade que geralmente advém da posse de um sinal ou signo, forçam os demônios a ceder. O que poderia ser tal sinal ou signo?

Falamos anteriormente do “Signo da Origem”, a marca indelével do Espírito Eterno, que devemos reincorporar à consciência para revertermos a maldição do esquecimento imposta por Yaldabaoth: tal signo é a prova da nossa origem divina, e portá-lo conscientemente é algo por si só escandaloso e aterrorizante para os Arcontes. Entretanto, embora todos os homens espirituais possuam tal signo, em geral não o portam, porque não se lembram quem são, nem como foram aprisionados neste mundo.

A re-incorporação do Signo da Origem: eis a Sagrada Teogamia, quando o homem novamente encontra sua Epinoia – a memória espiritual consciente enviada pela Minne – e se torna Theoantropos, homem divino e perfeito, ou ‘Perfecti’, na terminologia cátara medieval. Este processo, longo, duro e extremamente instável e incerto, cheio de armadilhas e dificuldades, somente se desenvolve através de uma práxis constante e cíclica de isolamento interior, catarse e Theosis. Neste estágio, três dos Mysteria cátaros ou “Pérolas” se referem à práxis ou prática diária e perene do Cátaro dedicado; estes Mysteria estão custodiados pelo Éon Daveithai, um Siddha (guia) cujo olhar incessante busca pelo mundo, sem parar,  os homens prontos a serem iniciados e admitidos no Pleroma. Civilizações antigas o entenderam erroneamente como um “deus” e o chamaram Vides, Hades, Plutão ou Pwyll Penn Annwn, o guardião do “mundo dos mortos” onde se obtinha o descanso e restauração supremos; ou então como Mercúrio ou Heimdall, o Guardião da Ponte que une o humano ao divino. Seus anjos são Micheus, Michar, Mnesinous, os que batizam na fonte da Água da Vida Eterna.


Bonomia, a Bondade Divina

A Santidade está conectada com o potencial da bondade infinita

A Santidade não se traduz em atos ascéticos ou leitura de livros, mas no potencial crescente da bondade, da atitude nobre da compaixão desprendida do alto da Divindade pessoal. A medida do Potencial Divino é a bondade, que não é ser passivo nem evitar a Guerra, mas simplesmente ter a compaixão de auxiliar o bem daquilo que existe, e devolver o inexistente à inexistência, eliminando sua dor e deformidade.  

Isto é difícil de se distinguir. A chave está na razão da guerra que travamos: em todas as atitudes tomadas por um Cátaro, existe um denominador comum que é minimizar o sofrimento. Às vezes, é necessário exercermos compaixão para diminuir o sofrimento numa determinada situação, mas às vezes é necessário atacarmos, combatermos e sermos duros para evitar que alguém gere ou propague sofrimento. Às vezes, é preciso cortar o mal pela raiz: em situações extremas e radicais, eutanásia ou suicídio. Tudo isso é bonomia, é Bondade divina, pois é se colocar como contraponto ativo da principal atitude expressa pelo “amor” doentio de Jehova-Satanas: a extração da Dor, seu alimento predileto.

Para o Cátaro, um nascimento neste mundo é uma tragédia, e o recém-nascido é acolhido e amparado com amor e dedicação, mas tristeza profunda por ele ter caído no abismo Terra. As religiões de Jehova-Satanas pregam a abstinência e o sexo reprodutivo para gerar mais pasto de onde ele possa extrair dor. Para nós, ao inverso, deve-se sim esfriar as paixões – mas qualquer forma de sexo não-reprodutivo é preferível à gravidez. Os filhos que um Cátaro já tenha: é um dever criá-lo para ser um homem íntegro e honrado, puro; os que ainda não tiver, ele evitará ao máximo ter.

Tal postura em relação ao sexo foi um escândalo na era medieval: afinal, se atacava a doutrina católica de estar “aberto à vida” e se dizia francamente que os casais deveriam fazer qualquer coisa, menos engravidar... nos autos inquisitórios, acusações absurdas de orgias e excessos contra os Cátaros, chegando ao ridículo de se incluir como “prova” para a condenação de um grupo de homens que eles cavalgavam em carangueijos gigantes até locais de orgia com demônios... os inquisidores incluíram de tudo nessas acusações de “orgias”, de sodomia até canibalismo. O que é uma ironia amarga, afinal a última coisa que se poderia acusar uma religião malteísta, que prega o desligamento voluntário das experiências mundanas, é de hedonismo.

Mais ainda: Vivemos numa cultura doentia que quer propagar e prorrogar a “vida” não importa em que estado, às vezes forçando seres a viver no mais absoluto sofrimento: pessoas em coma irreversível, animais sem patas, deformidades horríveis e dolorosas. Chamam isso de bondade, de respeito à vida, mas é uma maldade diabólica, como a dos espíritas que pregam a NECESSIDADE do sofrimento para evolução.

Não precisávamos sofrer: éramos perfeitos e eternos antes de cairmos vítimas dos Arcontes! Por isso a “vida” do Cátaro não é vivida com o objetivo de aproveitar os prazeres ou “ser feliz”, mas sim nos devotamos à tarefa da libertação própria e do alívio, sempre que possível, do sofrimento alheio. Isso é Bonomia.

A Pureza da Origem está na composição do Theoantropos

O pecado original vem do demiurgo, e a pureza original do Theoantropos. Nascido do pensamento luminoso do Pai, ele é original e incondicionalmente puro. Quando o homem se liberta dos medos, quimeras e pensamentos, ele brilha com a pureza original do Pai.

Para isto é necessário mudar nossa composição interna, tendo passado pela metanoia e feito votos de catarse até o ultimo minuto de vida.


Paratge
Paratge é uma palavra em Occitano (dialeto provençal falado pelos cátaros medievais do sudoeste francês) que não tem equivalente em nenhum outro idioma, vivo ou morto. Nos textos cátaros era sempre empregada num sentido semelhante ao Dharma hindu, uma lei ou ordem natural, o caminho do correto – mas não é este o significado.

As novelas de cavalaria, o ideal cortesão dos Trovadores, a bonomia e o código de honra dos fidalgos são aplicações terrenas da Paratge, e tocam superficialmente seu significado.

A Paratge, em palavras simples, é a conduta natural do Espírito, aquilo a que ele se sente impelido. Estando totalmente fora da moral deste mundo, acima do bem e do mal, a Paratge se manifesta através da Pureza do Espírito, quando ele responde aos desafios do inferno com sua Honra, de uma maneira que não provém da mente e pode ser interpretada como loucura, extremismo ou ingenuidade por aqueles que só conseguem enxergar o mundano.

No processo de Catarse a Paratge é redescoberta naturalmente, e vai gradualmente destruindo noções satânicas como a malícia, o egoísmo e o medo. A própria vida vai sendo percebida como uma estadia temporária, e relembra-se a Hostilidade ao Demiurgo. Aquele que despertou totalmente para a Paratge é um Cavaleiro do Espírito como Parsifal, e seu destino é encontrar o Gral.

A partir deste ponto, a Honra tomará um significado totalmente novo: não apenas um código de regras morais, não a expressão de uma ‘Regula Monachorum’, não uma mera moral: a Honra, para o Cátaro, o Cavaleiro do Gral empreendido na busca pela Minne, será a abnegação absoluta, o dar tudo de si na guerra contra Jehova-Satanás. E ainda assim, não se corromper na luta, mas ser o contraponto da malícia, um exemplo luminoso de cortesia e bondade natural como não há entre os filhos do horror! Da Paratge que os trovadores medievais cantavam, nasceu a cultura da cavalaria, do que é a noblesse, mas a fonte deste comportamento não é senão a Pureza absoluta do Espírito que nasceu do pensamento do Pai de Puro Amor.

A Paratge é algo diferente para cada um, mas mutuamente reconhecível pelas pessoas espirituais, e embora possa ser expressa e falada, sua explicação completa em palavras mundanas é virtualmente impossível para quem não a vivenciou.


Catharsis

Catharsis (purificação) é um antigo termo místico. Sua origem como prática iniciática se perde nas remotas escolas da Atlântida. A Catharsis é completa purificação, preferência incondicional e enérgica pela pureza divina, e o caminho para a perfeição na pureza – o Catarismo é literalmente a prática da Catharsis.  

A Catharsis assume esforços heróicos
Por sua natureza sofrida e abusada, fragilizada pela remodelagem adaptativa, o homem é preso na rede do demônio. Ele é doente, fadado ao fracasso. Ele está num estado de calamidade.


A Catarse completa, a perfeita pureza, é necessária para a divinização. A Catarse assume esforços heróicos para passar por cima da modelagem fatal, para poder confrontar uma a uma as forças demoníacas, de dentro e de fora de si, com a força advinda do Pai.

Pois nos é assegurado pelo Pai que, enquanto desejarmos lutar com todo o ardor do Espírito, nunca nos faltarão forças para suportar os ataques do demônio. O Nosso Pai Incognoscível nos fornece, no seu mais alto Amor, energia infinita através da sua Paraclese. Por isso, quando cantamos a Evocação ao Paráclito:

 - Ó SENHOR, ENVIA O TEU ESPÍRITO / QUE RENOVE A FACE DA TERRA

Estamos na verdade chamando o Paráclito, Hipóstase de Misericórdia do Pai, para “varrer céus e Terra” de dentro da nossa mente, para destruir dentro de nós o mundo (o desejo-paixão que gera sofrimento e agrilhoa), e que nossa psique renovada brilhe, livre, com a pureza luminosa do Espírito Eterno! O Apocalipse clamado e desejado é interior, psicológico, microcósmico.

Componentes da Catarse cátara:


1. Extrema introspecção (de ‘intro’ – interna e ‘spectrum’ – luz). Adentrar a si mesmo, olhar sem ilusões o seu eu interno. 

2. Percepção do engano. Refinar os sentidos e a percepção para detectar os enganos da modelagem adaptativa. Que pensamentos e sentimentos são genuinamente espirituais, e quais foram “programados” para nos prender ao Mundo e sofrermos?

3. Oração, rituais e o comunicar-se com o divino são coisas espontâneas, de momento. Evitar memorizações e formas vazias. Valorização da essência dos atos, orações, ritos e fórmulas, ao invés da forma. 

4. Desapego das paixões. Abluções constantes (limpeza interna e externa). Lavar as mãos constantemente, antes e depois de realizar atividades mundanas sujas como o comércio, trabalho, ou banhar-se, especialmente em rios, lagos e mares, são atos rituais indicativos de purificação, que nos lembram o que devemos fazer com nossas paixões e aflições. 

5. Remodelagem divina. Aperfeiçoar a arte de remodelar e readaptar a si mesmo, cortando o efeito abusivo das paixões e febres que nos acorrentam ao que pertence a este mundo.

6. Alerta constante dentro da introspecção, estado interior de guerra. Por mais que nós controlemos os pensamentos, não controlamos seu surgimento, daí ser necessário um alerta constante para combatermos a modelagem adaptativa, até nossa morte terrena. A verdadeira Paz só virá quando abandonarmos o Inferno de Jehova e voltarmos ao Pleroma. 

7. Paratge – a vida regida pelo senso transcedental, eterno e absoluto, de Honra. 

Caminho para a Suprasubstanciação de Si Mesmo 

A Catharsis exclui a confissão diante do Terrível Algoz, exclui totalmente a culpa e o remorso. Não admitimos sentimentos de culpa e pecado, pois somos Espíritos puros, nos desfazendo de eras de maus tratos e condicionamento satânico. Deve-se ter a consciência lúcida o suficiente para viver num mundo que não nos pertence, estrategicamente, sem, no entanto jamais se sentir pertencente ao mundo. O que significa que não exigimos austeridades, não impomos jejuns nem votos de pobreza, pois o importante não é o que efetivamente se FAZ no mundo, mas o que está no coração, o que gera paixão/sofrimento e o que prende, ou não.  Existem nove verdades a serem lembradas diariamente, constantemente:


1. O homem é o sujeito ativo da Divinização. (O que implica esforço ativo, não uma espera passiva de milagres ou misericórdia).

2. Só há um poder, o poder do Amor Celeste, Minne. Expresso através de Epinoia, a Memória perdida do nosso Eu espiritual, que é a Dama distante a quem os Trovadores amavam até a morte e se deixavam morrer de nostalgia por Ela.

3. Herança Divina. O Divino vive, indiscutivelmente, dentro do homem, mesmo em casos de abandono extremo. SEMPRE é possível retornar ao Pai. Muitos são fracos demais para despertarem por si, mas esses irmãos sofridos não serão esquecidos no Final do Final.

4. ‘Strastnoe’ (o sofrimento transformado em estado de beatitude). O Milagre das Solovki. Cada Espírito é convidado a enxergar e reconhecer seu sofrimento mais profundo, enxergando a vida na Terra como a própria experiência do Gólgota, e assim alçar os olhos para o lar perdido, reatando os laços com a Minne e ganhando uma calma e um sorriso perenes no meio da tormenta do inferno. 

5. Hostilidade Essencial: não há Espírito dono de si que não lutaria contra o príncipe deste mundo. Pessoas espirituais lutam uma batalha mortal com ele. 

6. A Última Gota. Os Espíritos Divinos, mesmo longe da perfeição, podem condensar em si sua pura essência sagrada, suprasubstancial, em um ato derradeiro de Honra na batalha contra o príncipe do mundo. É possível aos que nunca chegaram a ser Perfeitos ver a Minne e ascender ao Pleroma se o martírio na batalha espiritual foi realizado com a máxima Honra concebível. 

7 O Cálice, a Última Gota transubstanciada de todos os mártires, irradia uma luz suave desde o Pleroma, somente visível aos olhos do Espírito: esta luz é a essência da nostalgia pela Amada perdida e a Pátria inalcançável. 

8. A Cruz, símbolo que não carregamos, mas que olhamos aonde ela está – pendente sobre cada ser vivo - para relembrar qual é a essência deste Mundo: um instrumento de tortura e morte. 

9.Kristos Luz, hipóstase de Autogenes, desceu ao Mundo para vencer Morte, ensinando a Doutrina do Despertar. Não confundir com a farsa essênia. Kristos teve várias Hipóstases terrenas, mas para o Cátaro isso não importa (como importa às religiões locais que floresceram através de vindas específicas do Kristos), nos importa o Kristos Luz em sua essência atemporal, imutável e eterna. 

10.A Igreja Cátara. Após vencer a Morte com a ajuda de Epinoia, seremos reintegrados a nossos camaradas, nossos companheiros em Espírito de todas as épocas e culturas, que fizeram o mesmo. A congregação cátara não é deste mundo, não está no mundo, e quando a integrarmos não seremos mais humanos.




terça-feira, 2 de abril de 2013

A REVELAÇÃO DAS QUINZE PÉROLAS DO CATARISMO [3/5]


A REVELAÇÃO DAS QUINZE PÉROLAS DO CATARISMO [3/5]
Potencial Divino e a Guerra Espiritual



“Entenda, que aquele que está na escuridão não poderá ver nada, a menos que receba luz, e por intermédio da luz recupere a visão. Examine a si mesmo, para ver se possui a luz em tal quantidade que, ao se perguntar sobre as coisas elevadas, possa compreender como irá escapar; pois muitos estão buscando nas trevas, e eles tateiam sem rumo, desejando compreender, uma vez que não há luz para eles.
Meu filho, não permita que a sua mente olhe para baixo, mas que por intermédio da luz olhe sempre para as coisas que estão acima. Ilumine sua mente com a luz do Céu, para que possa se dirigir a ela.”
(d’O Livro de Tomás o Competidor)


                A espiritualidade cátara está longe de ser pacífica; aqueles homens simples e abnegados, que praticavam a bondade e pregavam o ascetismo e a Paratge – os valores inatos condensados sob a égide do que chamamos Honra -  abdicaram deste mundo, abdicaram de tentar interferir no devir deste mundo para purificarem a si mesmos para a grande guerra: a guerra que acontece dentro de si mesmo, contra os próprios instintos, visando quebrar os grilhões do psicológico e mergulhar nas águas da consciência na busca do Theoantropos, o Homem Divino que existe corrompido dentro de nós: essa busca implica uma batalha microcósmica mortal contra o Rei do Mundo, o Demiurgo criador e mantenedor deste mundo.

                Esses homens mal compreendidos – doces, porém duros, justos, porém cruéis com as próprias almas, negadores do mundo e da vida, e afirmadores da vida na morte – são tomados pelos reconstrucionistas e teóricos modernos como pacíficos pregadores de uma religião de amor e tolerância universal. Isso é uma meia-verdade perigosa.

                Evoco um artigo do filósofo russo Alexander Dugin sobre o contraste, nas tradições religiosas, entre as vias “do leite” e “do vinho”, para posicionar depois os Cátaros no segundo grupo:

“A humanidade sempre teve dois tipos de espiritualidade, dois caminhos -  ‘o caminho da Mão Direita’ e o ‘caminho da Mão Esquerda’. O primeiro é caracterizado pela atitude positiva em relação ao mundo ao redor; o mundo é visto como harmonia, equilíbrio, bem, paz. Todo o Mal é um caso particular, um desvio da norma, algo não-essencial, transiente, sem razões transcendentais profundas. O Caminho da Mão Direita é chamado a ‘Via do Leite”. Essa via nunca fere uma pessoa, ao contrário, a preserva da experiência radical, a protege da imersão no sofrimento, no pesadelo da vida. Este é um caminho falso. Um caminho que leva a um sonho. Um sonho que, se seguido, não levará a lugar algum.
O segundo caminho, o ‘Caminho da Mão Esquerda’, vê tudo como uma perspectiva invertida. Não como uma tranquilidade diária, mas sofrimento negro; não como a calma silenciosa, mas o drama tortuoso e ígneo da vida destruída. Este é uma ‘Via do Vinho’. É destrutiva, terrível, o ódio e a violência reinam aqui. Pois aquele que segue neste caminho percebe toda realidade como inferno, como exílio ontológico, tortura, imersão no coração de alguma catástrofe inconcebível originada nas alturas do espaço. Se no primeiro caminho tudo é visto como bem, no segundo tudo é visto como mal.
Este caminho é monstruosamente difícil, mas é o único verdadeiro. É fácil tropeçar nele, e mais fácil ainda perecer. Ele não garante nada. Não tenta a ninguém. Mas este caminho é o verdadeiro. Quem o segue – achará glória e imortalidade. Quem resistir conquistará, receberá o prêmio, que é mais elevado do que a própria vida. Aquele que segue o Caminho da Mão Esquerda sabe que um dia a prisão terminará. A prisão da substância irá colapsar, tendo se transformado na cidade celestial. A cadeia de iniciados apaixonadamente prepara o momento desejado, o momento do Fim, triunfo da libertação total”.
(Alexander Dugin, “The Gnostic”)

                As três Pérolas seguintes possuem relação com a Meta Sacra do Catarismo – esta “libertação total” da “prisão da substância”, a restauração do homem em Theoantropos, no Espírito Divino criado pelo Deus Verdadeiro e aprisionado pelo Arconte-chefe, o Demiurgo Jehova-Satanas, Yaldabaoth, Sakla, e sua hoste de arcontes. Então, em síntese, o Catarismo é necessariamente uma via da Mão Esquerda, pois chegam a ele aqueles homens cuja busca espiritual os ensinou a visão pesadélica da vida terrestre, e uma nostalgia da Vida Eterna cujo valor é maior do que a vida e a morte.

                O Segundo Luminar, Oroiael (Uriel), aquele por quem os Bogomilos chamavam em momentos de grande necessidade, governa estes Mistérios; Uriel                                                                       é um Siddha belicoso, e seus Custodes são aqueles que entronam o Iniciado, vencedor da Guerra Sagrada, nos Tronos de Glória: Bariel, Nouthan, Sabenai.


Potencial Divino

·         Modelagem Adaptativa:

                A cada encarnação terrena do Espírito aprisionado, Satanás impõe uma re-modelagem adaptativa.

“Este é meu mundo”, – ele diz – “e para executar sua finalidade, você deve estar adaptado às suas leis e convenções. De outra forma não viverá”.

               
Aceitar passivamente essas adaptações, de natureza psicológica, sela o destino fatal do Divino dentro da pessoa. A remodelagem torna a vítima sujeita aos algoritmos e programas arquetípicos, um prisioneiro do arquetípico, e do abismo quadridimensional Terra. A forma de imposição desse programa é a energia satânica que vive e age independente dentro de nós, chamada ALMA. A Alma pertence a Yaldabaoth, foi criada por ele, e não deve jamais ser confundida com o Espírito eterno criado pelo Pai.

                Vale dizer, que não se trata de uma simples imposição de ideias externas, como uma hipnose ou possessão, mas uma modelagem da psique naquilo que Nimrod de Rosario chama de “Estrutura Cultural Habitual”: as próprias formas de pensar, os algoritmos que geram o pensar racional, são feitas para processar e assimilar a obra do Demiurgo, e a cada descoberta adorá-lo. Essa é a primeira modelagem, a que não nos permite enxergar por vias racionais NADA do que está fora do Universo criado, porque a mente humana foi modelada para lidar apenas com o criado. Restam-nos a consciência da Nostalgia, e a orientação espiritual para nos guiarmos.

                A segunda remodelagem adaptativa, buscada como “Iniciação” pelos adeptos das religiões satânicas, é o cancelamento da união da pessoa com o Espírito Divino, quando o Espírito transfere à alma mortal sua última energia e desaparece. Não há mais Theoantropos. Só o anthropos permanece – um homem isolado, alienado de sua origem Divina para sempre.

·         ‘Não tomarás o Usurpador pelo Pai!’:

                Jehova Elohim, ‘Senhor Deus’ – a formula já aparece em Genesis, III. Assim Elohim se declara o Deus do todo. É um engano! – ele não é o Pai, mas um impostor.

                O desastre da remodelagem adaptativa é esquecer o verdadeiro Senhor e continuar a venerar este Arconte malicioso, a desejar e amar sua criação medíocre.

‘A Terra pertence a Jehova, mas não nós! – Os Cátaros diziam a todo momento, como Noria dizia a todo momento. – Não tomarás o Usurpador pelo Pai’.

·         Restauração de um Ícone:

                Jehova-Satanás, Yaldabaoth, põe o Espírito num sopor instantâneo, e nas suas manipulações astrais, insere a modelagem adaptativa que faz o Espírito crer que é o homem de barro, que impõe o esquecimento sobre sua origem e condição. Mas esta modelagem adaptativa não afeta a origem profunda da pessoa.

                Mas a comunidade dos Cátaros sabe: a personalidade, o eu terreno, o mar de emoções e raciocínios não é o Espírito, mas este, aprisionado, aporta sua energia para a psique. Desta forma, todo o mal, toda a malícia e imundície humanas, todo o comportamento demoníaco, não incorrem em culpa alguma. O Espírito é Santo, Puro, Inocente e Honrado, como um Ícone que se desgasta e deteriora não por sua própria culpa, mas pela exposição indevida ao pó e aos elementos a que o submeteram. Todas as vítimas da remodelagem adaptativa satânica devem ser instruídas a viver sob constante Catarse, alertas para as armadilhas que brotarão, espontaneamente, de dentro da Alma. Então poderão ser restauradas pela Paraclese Divina do Pai manifesta no Batismo pelo Espírito Santo Divinizador.  Citando uma passagem importante:

“Então, quando o útero da alma, pela vontade do Pai, volta-se para dentro de si mesmo, a alma é batizada e imediatamente limpa da poluição externa que foi lançada sobre ela, assim como as roupas, quando estão sujas, são postas na água e reviradas até que a sujeira seja removida e as roupas se tornem limpas. Tal é a limpeza da alma para recuperar a juventude de sua antiga natureza e para retornar a si mesma: tal é seu batismo”.
(A Exegese da Alma)

·         Potencial Divino, e Potencial Satânico:

                O Catarismo ensina que o Potencial Divino se realiza através do isolamento interno, fazendo de si mesmo um modelo vivo de Montségur, a montanha fortificada detentora do Gral. O processo constante de Catarse leva à polarização dos fenômenos percebidos em divinos e satânicos, o que leva à purificação da consciência fechada em cerco contra o mundo diabólico de Yaldabaoth. 
                Ao contrário, o Satanismo Cósmico reúne todas as religiões e filosofias que pretendem conformar o homem à vida na Terra (judaísmo, grandes religiões institucionalizadas, teosofia, fraternidade branca, thelema, maçonaria etc), que pretendem implantar nele a apatia, a obediência, o conformismo e um falso consolo que inspira à aceitação passiva dos sofrimentos e torturas da vida abismal na Terra, chegando mesmo ao gosto pela vida na Terra. A harmonia, o pacifismo, a conformidade, a libertinagem, a fragilidade psicológica, a carência explorada, o ir com a corrente, tudo isso leva ao desprendimento do Potencial Satânico, que é a obediência às leis de Jehova-Satanas. Há uma guerra no mundo entre forças que querem desprender nos indivíduos um destes dois potenciais, e a todo momento os indivíduos são agentes de um dos dois lados beligerantes, cabendo a cada um escolher o lado que defenderá, de acordo ao Potencial a que aspira.

Theoantropos

              
  Acreditamos que não há ser, não há homem, fora da Divindade. O homem só existe de fato na Divindade, e a separação da consciência humana da supraconsciência transubstanciada Ehre, fruto da modelagem adaptativa a que Yaldabaoth nos submete, faz com que o humano sem o divino perca sua existência real.

                Ora, sendo o mundo uma ilusão miserável, é possível que existam criaturas de todas as espécies – inclusive homens – que são manifestos (na ilusão) mas não possuem existência real. Nós definimos o grau de existência real pela manifestação da Consciência espiritual (como definida em Gurdjeff, Ouspensky e Nimrod de Rosario), que é a própria Divindade a ser restaurada.

                A Divindade habita o homem através das composições divinas inseridas em seu nascimento.

                O corpo é apenas um vaso para atrair e prender o Espírito Imortal; os selos que atraíram e prenderam o Espírito na Carne, chamamos de Signo da Origem, e a consciência deles permite a reunião com Minne e o retorno ao Pleroma, ao nosso Lar Espiritual. Tais Selos foram postos pelos Arcontes eras atrás, e são passados geneticamente. Todos nós os possuímos, e, portanto temos em nós a essência divina.

                O objetivo e missão do homem na terra não é desfrutar da ilusão miserável de Yaldabaoth, Jehova-Satanas, o Rex Mundi, mas mergulhar na consciência catártica e compreender o Signo da Origem, compreender o próprio aprisionamento, tornando-se novamente divino de acordo com a vontade amorosa do Pai – um Perfeito, um Iniciado, um homem-deus – Theoantropos.

                A essa elevação do humano ao sobre-humano, à superação de todos os grilhões e compreensão da Origem – a isto chamamos a Meta Sacra.

                Existe, na nossa prisão, um Mistério que faz com que mesmo a malícia de Yaldabaoth e todo o sofrimento do mundo acabem servindo à Glória do Espírito, do Pai Celestial. Este Mistério está contido no conceito de Desafio.

                Abandonar o Deserto material é um poema de Amor celeste escrito com o sangue. O grito de impotência e inveja do Rex Mundi quando um prisioneiro escapa, é uma vitória de Deus sobre Satanás. Por isso a vida humana, em si própria um lamento eterno nas cinzas, ganha força e brilho quando, imbuído no Amor celeste, o homem toma para si o desafio de transmutar a si mesmo em Theoantropos.

                Os Éons e Luminares olham comovidos de seus tronos no Pleroma, quando dos Céus Caóticos enevoados de Satanás um não-mais-humano eleva sua última gota de sangue às esferas supracelestes em retribuição ao Amor recebido, na forma da Luz Imaterial, consubstancial ao Pai, que chamamos Vril, a Essência do Espírito. 

                Cada vez que esse brilho se produz na escuridão da Matéria, como um raio trovejante em meio às nuvens, marcando o nascimento  do Theoantropos, a Vitória Celeste sobre os Arcontes é assinalada com uma certeza absoluta e incontestável.

                Vencer o desafio de se libertar de Yaldabaoth – eis a Meta Sacra.

Reencarnação Estratégica

                Uma imagem aristocrática da reencarnação dos filhos de Set:

                 A reencarnação é a terceira armadilha de Yaldabaoth, o mecanismo infernal para sugar todo o  sofrimento da alma. Na versão farisaica do Cristianismo a reencarnação é negada: o medo do julgamento mantém as pessoas na escravidão pecadocrática da moral "cristã". O Tibet entende a reencarnação como metempsicose (reassentamento da alma). O Budismo geralmente tem uma visão acertada do mecanismo infernal da reencarnação, conhecido como Chave Kalachakra, e as punições reservadas às almas, reencarnando em seres cada vez mais baixos e sofridos. Os Arcontes e seus anjos são às vezes chamados Senhores do Karma, pois sua ocupação é torturar e extrair dor das almas, dor que é o alimento espiritual de Yaldabaoth.

                Os Puros conseguem se libertar deste ciclo, mas a maioria deles não quer ser retida no Pleroma. O Espírito não quer retornar aos Céus enquanto outros seus iguais estão sofrendo. O Espírito se torna sedento em multiplicar sua experiência de transfiguração e é ávido por levar consigo mais alguns Espíritos para fora dos Gólgotas de Jehova Satanas. O Espírito sabe que jamais, na eternidade, o Pai irá abandoná-lo sob nenhuma condição... a menos que ele conscientemente renegue e traia sua missão terrena, se afastando voluntariamente do Pai, e da própria Paratge.

                A noção de reencarnação estratégica deixa o homem confiante e incapaz de ceder ao medo. Mesmo na prisão infernal de Yaldabaoth, temos a vida eterna, manifesta na Guerra e na camaradagem com nossos irmãos em Espírito. Uma fase passageira numa longa e ininterrupta existência. O guerreiro flui através da vida e da morte nessa dinâmica ascendente e descendente, até que seu Potencial Divino se cumpra e o último Espírito seja liberto da rede de Jehova Satanas. 

                Essa é a Aristocracia do Espírito, descida dos céus para a guerra contra Satanás, encarnada nos atlantes, nos dórios, nos tartésios, romanos, citas orientais, germanos, turcos e mongóis, em diversas civilizações dos vales ibéricos até os confins dos montes Altai, que da sua forma particular cantaram em honra a Minne. Tal Aristocracia sempre coexistiu e combateu os filhos do horror, as crias do Demiurgo, e hoje, numa modernidade de trevas que destruiu todos os povos e culturas, os castelos e cercos são microcósmicos, individuais.

                A imersão nestes Mistérios revela à Consciência mais do que nossa identidade espiritual, mas nosso propósito, nossa missão – em nome de cuja consecução devemos estar sempre alertas às armadilhas do demônio. Afinal de contas, a existência de uma Meta Sacra, e a revelação da verdade de uma guerra cósmica que se reproduz dentro de cada um, faz com que o Catarismo, como todas as filosofias e religiões vistas sob a ótica da “Mão Esquerda”, seja muito mais do que um pessimismo Sans Volonté, como em Cioran ou Schopenhauer, mas uma via bélica e contundente de obliteração do mundano e reafirmação vigorosa do Divino.