La Montagne

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Fechados contra o Mundo e seu Rei, Espírito contra Matéria!

domingo, 11 de setembro de 2016

A morte por mil cortes

A morte por mil cortes 
(e um ‘mea culpa’ há tempos necessário)



     A ignorância a respeito do Pai trouxe terror e medo. E o terror se tornou denso como uma névoa – ninguém conseguia ver. Por causa disto, o erro se tornou forte. Mas este trabalhava em vão sua substância hílica, porque desconhecia a Verdade. O erro foi moldado para preparar, com Poder e Beleza, um simulacro da Verdade. Isto, então, não foi uma humilhação para Ele, que é ilimitado e inconcebível. Pois eles eram como o nada, esse terror e esse esquecimento e esta figura de falsidade, enquanto a Verdade estabelecida é imutável, jamais perturbada e completamente bela.
     Por esta razão, não leve o erro a sério demais. Pois este, não tendo raíz, não é mais do que uma névoa para o Pai, engajada em criar medo e esquecimento para enganar aqueles que estão no meio e faze-los cativos. O esquecimento do erro não foi revelado, não se tornou uma luz ao lado do Pai. O esquecimento não existiu a partir Dele, ainda que exista por causa Dele. O que existe no Incognoscível é o conhecimento, que foi revelado para que o esquecimento possa ser destruído e para que eles O conheçam. Uma vez que o esquecimento existe porque eles não conhecem o Pai, a partir do momento em que o conheçam o esquecimento cessará de existir.
(o Evangelho da Verdade)


O Cátaro está em eterna peregrinação rumo a montanhas mais altas e isoladas, e de acordo com um adágio celta, a existência é, em si mesma, uma peregrinação eterna e incessante. No caminho, somos forçados pelo cansaço a deixar, na beira da estrada, todo o supérfluo, todos os adereços artificiais que não pertencem ao Ser: esse trabalho de purificação é o que há de mais difícil e árduo na nossa doutrina, porque a Alma é um animal de hábitos, e quimeras psicológicas não são abandonadas sem oferecer uma resistência violenta ao nosso impulso consciente de purificação.

Essa dificuldade extrema leva o Cátaro ao imperativo da sinceridade extrema – a vontade de ser puro faz com que não temamos ser extremamente abertos em relação a nossas falhas e defeitos, porque não nos apegamos a eles nem os identificamos com nosso próprio ser: todas as falhas e defeitos que possuímos são armadilhas, são deformações impostas pelo Criador que remodelou e amputou nosso Ser Original para que este “coubesse” na Alma limitada que ele criou.

Dito isto, faço um ‘mea culpa’ que há tempos se faz necessário: há mais de dois anos eu venho negligenciando a manutenção desta página, que eu julgo como uma alta prioridade da minha vida espiritual (e que outra vida existe, na verdade?); o que me impediu de escrever e fez cessar minha inspiração por um bom tempo foi, talvez, a mesma armadilha que aflige a vida da maioria das pessoas e impõe obstáculos ao pleno exercício da espiritualidade: a forma como a vida moderna não apenas suga as horas do nosso dia na luta pela sobrevivência frente à instabilidade material da vida, mas ocupa nossa mente com neuroses e medos durante o percurso de todas as vinte e quatro horas.

Gurdjeff dizia que apenas uma pessoa com a vida material estabilizada poderia pensar nas questões da consciência e do espírito de forma desimpedida. Não concordamos com essa noção, porque retomar o espaço psíquico inundado pela neurose da sobrevivência e do medo da pobreza são, especialmente hoje em dia, o front espiritual onde a batalha é mais acirrada e intensa. Não há espiritualidade sem guerra espiritual. E a vida do homem moderno é o padecimento da morte por mil cortes, exatamente como no abate ritual Kosher, onde todo o sangue do animal abatido é drenado por numerosos e profundos cortes: atormentado por milhares de incômodos ao dia, estímulos de baixa intensidade e alta frequência de repetição (pressões no trabalho, meios de sustento eternamente insuficientes, medo do desemprego, medo do fracasso, violências diárias às quais não se pode reagir, pressão para suceder e produzir, e toda uma miríade de mensagens bombardeadas para ensinar a apatia, a desesperança, a obediência, o trabalho como sentido e utilidade da vida), o homem moderno não padece das mesmas dores e agruras físicas do homem primitivo, mas precisa lutar de forma cada vez mais agressiva para libertar espaços dentro da própria psique, para livrar a mente do controle/condicionamento externo, nem que seja por alguns instantes. O objetivo é verter e drenar nossa energia psíquica, volitiva, nosso Sangue Espiritual, em sacrifício e honra ao Príncipe do Mundo, que se regozija no derramamento ritual de sangue.

Nossos irmãos em espírito caíram nos escombros de Montségur, Beziers, Carcassonne e onde quer que homens despertos tenham sido martirizados; mas nos dias de hoje, onde o adversário terrível possui todo o domínio do mundo da matéria, o front retrocedeu e estamos lutando pelo controle de nossa própria mente. E o inimigo veicula a todo o momento, incessantemente, mensagens de desesperança e medo, de desejos inalcançáveis e da ameaça velada da miséria para os que não se submetam. Cabe a cada peregrino encontrar na Origem de Si Mesmo o manancial de força infinita, Graça suprema do Paráclito do Incognoscível, para levar adiante essa luta e libertar nossos castelos interiores, nossa esfera psíquica, do controle da neurose e do medo.

Mea culpa – negligenciei minha missão espiritual, tendo passado dois anos da minha vida sem esquecer um minuto da minha espiritualidade, mas sempre “ocupado demais” com o trabalho, com a falta de dinheiro, com o imperativo de gastar todo o meu tempo livre estudando OU SENÃO eu seria descartado pelo rei-mercado como um inútil... porém, o erro foi revelado, e diante disto, neutralizá-lo e reverter seus efeitos é um imperativo absoluto no processo de Catharsis.

Deixo isto como um exemplo a todos, de que não devemos ser fariseus e fingir que as necessidades da vida material não são um imperativo – afinal, devemos sobreviver para continuar trilhando nosso caminho – mas que basta ceder a um medo, a uma neurose, para que o controle sobre essa vida material seja perdido e sejamos jogados no turbilhão da vida, sem controle sobre os rumos e sobre o tempo que transcorre... devemos ter como alta prioridade, na guerra espiritual, buscar sermos senhores do próprio tempo e do próprio destino, relegando os anseios do corpo e da alma ao seu papel secundário e vivendo sempre sob a ótica imutável da preeminência do Espiritual: o que quer que auxilie na nossa peregrinação Montanha acima, o que se faça necessário para tal, é bem-vindo; o que não auxilie nesse processo, é um excesso descartável e precisa ser neutralizado internamente.


Reafirmo, agora e sempre, meu compromisso com o projeto desta página, na esperança de que possa ser um auxílio para os Buscadores do Espírito eterno, e alerto que o Tempo é um bem que traz mais poder do que o Ouro, nesta vida mortal: não apenas o tempo que transcorre, mas principalmente o Tempo interno, o direcionamento das energias mentais. Purifiquem-se de todos os cancros que sugam a atenção da mente e nos mantém com os olhos internos focados com preocupações e elucubrações deste mundo além do saudável e necessário para a sobrevivência, pois a energia mental desperdiçada é precisamente o análogo astral do sangue físico derramado nos templos do Rei deste Mundo. Falando alquimicamente, apenas o Louco, na neutralidade absoluta do ponto zero, está em condições para entrar, sair ou escapar da Roda incessante das aflições. Tal estado de neutralidade interior absoluta é e sempre será o mais alto objetivo do processo de purificação do qual o Catarismo se encarrega. Portanto, estejam sempre alertas!

Uma revisão dos textos anteriores será feita aos poucos, assim como uma reforma na página e dois textos novos em algum momento nos próximos dois meses.